Prática da corrida une mulheres no Afeganistão em meio às marcas de guerra
Redação Bahiarun, 16 de agosto de 2018
Mulheres correndo pelo Afeganistão ainda são uma raridade e uma completa exceção. Dificuldades das mais diferentes naturezas tornam a prática da corrida um desafio.
Mas um grupo de mulheres da capital do Afeganistão, Cabul, beneficiado por um projeto internacional, tem usado a corrida como demonstração de força e inspirado jovens pelo país.
Durante o regime talibã, entre 1996 e 2001, as mulheres enfrentaram severas restrições à liberdade e eram submetidas constantemente às violações de direitos humanos. Garotas não podiam ir à escola, por exemplo.
As afegãs não podiam trabalhar, não podiam dirigira automóveis e só eram autorizadas a sair às ruas se acompanhadas por um homem. Alguns direitos básicos foram conquistados desde então, mas ainda sobram para essas mulheres afegãs muitas dificuldades e preconceitos.
Por isso, a organização “Free to Run” ("Livre para Correr", em tradução livre) atua desde 2014 no país. O objetivo do trabalho é garantir que mulheres que vivem em áreas de conflito tenham a oportunidade de correr e, consequentemente, se exercitar e divertir-se pelas ruas.
Recentemente, o projeto ofereceu transporte e logística básica para que algumas afegãs treinassem para uma ultramaratona realizada na Mongólia. Elas corriam diariamente numa região a 30 minutos do centro de Cabul. As corridas de uma hora eram feitas num pequeno trecho de apenas 1,2km. Assim, elas ficavam indo e voltando até completar o percurso da sessão do treino.
O cenário dos treinos tinha as marcas da guerra recente e dos conflitos armados no país. Grandes cercas de arame farpado, construções destruídas e marcas de tiros. Uma vez por semana, as mulheres, em sua maioria na faixa dos 20 anos, faziam o “longão”, treino de cerca de três horas, em trilhas mais afastadas.
O projeto, então, selecionou duas delas para a prova na Mongólia. O processo envolvia, entre outros quesitos, explicar por que a vaga na ultramaratona era merecida. Segundo a revista "Runners World", Zeinab, uma das escolhidas, justificou assim que deveria ser selecionada.
“Se nós tivermos uma mente forte para suportar correr 250km no Deserto de Gobi, nossa mente será também forte o suficiente para as outras difíceis tarefas das nossas vidas. Quero mostrar às garotas afegãs que nós podemos fazer isso. Somos capazes de superar qualquer desafio para mudar o mundo”, argumentou.
Zeinab, inclusive, lidera um projeto no Afeganistão voltado para estudantes do ensino médio. Ela e sua amiga Hasina, também escolhida para a ultramaratona, dão uma aula chamada “Habilidades para a vida por meio dos esportes” num programa de desenvolvimento comunitário.
Na prova disputada na Mongólia, só Zeinab conseguiu terminar, após percorrer os 250km como o tempo de 59h24min16s, divididos em sete dias. Ela se tornou a quarta mulher afegã a completar uma ultramaratona internacional.
Nos treinos, ela e as demais mulheres do Afeganistão ainda não podem mostrar muito do corpo. Por isso, se cobrem de roupas, usam calças e camisas de manga comprida, além de lenços na cabeça. Só o rosto e as mãos ficam expostos.
Mas a cada passo delas pelas ruas de Cabul, elas fazem da corrida uma excelente ferramenta por uma vida com mais direitos, segurança e dignidade.
Fonte: Texto original publicado no UOL Esporte (texto editado)
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